“O meu amigo droguinhas” são cerca de quarenta anos ágeis, secos de carnes, altura mediana e sorriso fácil, que contam os dias arrumando carros por trás do Centro Comercial 2000.
Segundo pude saber através de uma entrevista publicada num semanário cá do burgo, “o meu amigo droguinhas” dedica-se a arrumar carros porque não tem paciência para cumprir um horário fixo numa empresa, contudo a minha amiga L.U. que mora nas “Varandas do Lis” garante que todos os dias, de Segunda a Sábado, cerca das sete horas, entra ao serviço e eu garanto que muitos dias às dezanove ainda está no seu posto de trabalho. O que seria se gostasse de cumprir horários?! A vida tem destas incongruências!
Há muitos condutores que lhe entregam o carro e as respectivas chaves sem se preocuparem em arrumá-lo, porque ele cuida disso. Essas pessoas pagam-lhe ao mês por esse trabalho. Quanto? Desconheço.
Sabe quem costuma estacionar e o tempo médio que demora e as horas a que costumam chegar e sair do parque os utentes habituais. Quando os carros são muitos e não se vislumbra qualquer lugar costumo brincar com ele “quando é que abre o subterrâneo?”,“ainda não acabaram as obras da parte de baixo?”ou qualquer outra questão no género, que nunca deixa sem resposta. Também nunca me deixa sem lugar, nem que para isso tenha de tirar do lugar um desses carros de que possui as chaves, para deixar em segunda fila a aguardar vez. Confesso que é o único arrumador a quem gosto de dar uma moeda, porque acho que a merece. Depois de agradecer a moeda despede-se com um “passa bem” que me arranha os tímpanos, que gostariam mais de ouvir “passe bem”.
Na manhã de uma recente Sexta-feira, em que, como habitualmente me desloquei à cabeleireira, ao chegar ao parque “o meu amigo droguinhas” informou “hoje só tenho um lugar, mas é muito difícil arrumar ali, por causa do candeeiro. Tem de ir de marcha atrás. Se não é capaz, eu arrumo-lhe o carro.” “Ó criatura de Deus, tenho cara de me amedrontar com tão pouco?” “Ah, mulher valente, assim é que eu gosto das ouvir falar” e torce dali, torce dali lá consegui enfiar o carro no sítio indicado.
Na manhã seguinte, voltei ao parque e lá estava o meu amigo “ontem nem a vi sair” disse-me com ar gozado à laia de cumprimento. “Deixei-lhe o candeeiro inteiro” retorqui no mesmo tom, “pois, mas há lá umas mossazitas que é preciso mandar reparar”. Ri-me e não deixei de responder ”quem lhe dera que eu o tivesse partido em dois; ficaria com o parque mais iluminado!”
Seguiu-se a moeda e a despedida habitual: passa bem!
E lá fui à vida com os tímpanos arranhados e as orelhas a abanar remoendo com os meus botões o habitual “vou fazer por isso”.
Não digo que os arrumadores, bem como as prostitutas, tenham uma vida fácil. No meu fraco entender se eles existem é porque algo falhou, ou se preferirem, porque há quem esteja disposto a “comprar” os seus serviços. Pessoalmente só gosto de ajudar quem realmente quer ser ajudado. Há tanto lugar de estacionamento livre por aí… e faz tão bem andar a pé. Riscos no automóvel? Claro que os tenho, com muito orgulho!
ResponderEliminarNão é por "medo" que dou a moedinha. Bem se vê que não me conhece! Só dou moeda a este arrumador por me arranja sempre lugar e sempre significa "quando não há".
ResponderEliminarQuanto ao "medo"... O assunto fascina-me, mas devo confessar que sou feita de uma massa estranha...
Os riscos do meu carro fui eu que os fiz, não estou nada orgulhosa, mas resultaram de uma marcha atrás feita de ouvido. O muro embirrou e não saiu do canto...