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segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

O VENTO


«O vento

Por mais que tente, o vento
não consegue adormecer
se não tiver nada para ler.
Seja uma folha de tília,
de bambu ou buganvília.
É por isso que o vento
arrasta as folhas consigo,
até encontrar um abrigo,
onde possa adormecer.
- arrastou até a folha,
onde eu estava a escrever!»


Jorge de Sousa Braga


Já aí chegaram as palavras?

10 comentários:

  1. Respostas
    1. Desculpe, Isabel, mas eu, como o vento não estava de feição, até já estava a desconversar com Deus e a recordar longas e velhíssimas discussões com um velho amigo de então (1964/54, zona da Batalha, até à ponte D. Luís, entre o refeitório da PSP e o meu Instituto, na Rua de Entreparedes, Deus é o princípio e o fim de todas as coisas, visíveis e invisíveis - debitava eu, que una anos antes até estive para ir para o seminário - ele, aí com uns 60 e tal anos, filósofo e vivido, que não, que Deus é a Natureza, etc defensor acérrimo da teoria da evolução e de Lavoisier, etc etc...)

      já estava a tentar acompanhar o próprio vento, desci à terra firme, e fiz um corte.
      Mesmo assim ficou o que reproduzo a seguir.

      Um abraço, que passe muito bem esta quadra natalícia.

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    2. Pois...
      o vento é bom bailador
      baila, baila e rodopia
      e tudo baila em redor

      Até eu e o meu pensamento, mais rápido que a agilidade dos dedos sobre o teclado.
      Quer dizer,onde deixei 1964/54 gostaria de ter deixado 1964/65. Como achei que já era demais voltar a eliminar, aqui fica a adenda.

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  2. Decididamente
    o vento pouco me tem dito
    o vento e o tempo
    o tempo que tão pouco me diz
    palavras leva-as o vento
    e o vento leva todas estas folhas
    amarelecidas, algumas já carcomidas
    e com elas vai este ciclo de vida
    que nos vai ficar de má memória
    de palavras ditas e desditas.

    Será isto só um ciclo?
    Não estaremos em mais um círculo
    deste círculo vicioso
    em que permanecemos?

    E as folhas aí andam
    numa sarabanda
    colorida, é certo
    mas numa grande zanga!

    ps.: escrito ao sabor do vento...as folhas em rodopio, mas bonitas mesmo assim, de tílias, de choupos, de liquidâmbar (tão âmbar que elas são!...)
    Depois, até poderei vir retratar-me... talvez!

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    1. Olá, António.
      Ainda bem que o vento não levou a sua folha…
      O vento pouco lhe tem dito, aceito, mas a mim, quando é fresco renova-me o pensamento. Esfria as emoções e ajuda-me a pensar com mais clareza. Desata-me os nós do pensamento. Adoro sentir na cara o vento fresco quando passeio pela margem do Lis ou quando me “equilibro” na Concha de S. Martinho. E confesso que nas estações menos quentes ainda gosto mais. Há gostos para tudo!!!! (e que saudades eu tenho do mar, mas não tem dado para uma passeata pela praia)
      Agora que o tempo “tão pouco me diz” discordo inteiramente. O tempo conta-lhe o que já viveu e acumulou consigo as memórias que fazem de si o homem que é. Sem tempo, sem memória, o meu amigo não existiria.
      Noto nas suas palavras uma grande inquietação em relação ao momento que se vive. Sente a incapacidade de gerir tamanha incerteza (quem não sente?). Questiona e questiona-se, numa perspetiva sofredora de quem olha e vê a garrafa meia vazia.
      Eu sou uma mulher de esperança. Acho que o verde me veio misturado nos genes, mas a vida também me ensinou que de uma maneira ou de outra, a seu tempo, tudo se resolve. Acredito no engenho humano, acredito na inteligência, na capacidade de adaptação, na capacidade de sobrevivência. Por convicções políticas acho que o caminho seria outro, mas também tenho a clarividência de admitir que não se saberá muito bem qual.
      Para seu escândalo deixe-me dizer-lhe que ainda me considero uma privilegiada. E pensarei assim enquanto ao fim do mês tiver o vencimento depositado na minha conta. Há tanta gente em situação aflitiva e não por terem dado uma passada maior que a perna, mas porque circunstâncias nefastas os atingiram, que eu nego-me a embarcar no desespero reinante.
      Ah! O dinheiro não chega para o que chegava? A quem o diz! Mas olhe que não ter nenhum há de ser muito pior. Ver gente que viveu desafogadamente fazer fila à porta da sede da Conferência da S. Vicente Paulo para levar comer para casa é confrangedor. Ouvir da boca da filha mais nova que a ceia de Natal em Lisboa, onde faz trabalho voluntário já não é só para os sem-abrigo, mas para muitos outros que já foram dos que deram esmola, também.
      A minha perspetiva é a da garrafa meia cheia. Recuso sentir-me derrotada antes de esgotadas todas as hipóteses e mesmo esgotadas estas, ainda tenho duas hipóteses afundar-me ou esbracejar para me manter à tona. Sou das que esbracejam para além das capacidades físicas dos braços.
      Pare de olhar para o umbigo. Ânimo! Você é um dos felizardos.
      Vá, agora zangue-se comigo que isso também ajuda a pensar noutra coisa.
      Para si, o meu abraço fraterno e solidário.

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  3. Ainda... Quanto a Deus... Sou crente. Não no Deus punitivo que me impingiram na catequese, mas no Deus que ampara, que anima e cria.
    Quando estou em situações de grande angústia penso que Deus nunca se engana e que me fará sair delas ajudando-me a pensar com inteligência para encontrar as melhores soluções. Nunca peço senão esse milagre, porque tenho sempre presente a advertência do meu malogrado amigo e também médico da filha mais nova, José Luís (que era ateu) “às vezes os santos fazem-nos os milagres, para nos castigarem”
    Isto é irracional? É sim. Mas eu desculpo a minha natureza estranha admitindo que a fé nada tem a ver com a razão

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  4. Cá venho eu tentar pôr alguma ordem nas minhas palavras atrás escritas nas folhas que o vento deste tempo leva por aí.

    Tem razão, muitos de nós, que reclamamos contra a situação, até nos podemos considerar uns felizardos tendo em conta a miséria que grassa por esse mundo fora. Mas deixe-me que lhe diga, que as nossas vozes também são necessárias para que se faça sentir a quem tem a obrigação (mais, o dever indeclinável) de orientar os destinos dos povos, que o faça com ponderação e abnegação.

    Não sinto que seja essa a situação atual.

    Mas, também tenho de o reconhecer, não tenho na manga, nenhum remédio suscetível de proporcionar rápidas melhoras.

    Quantas vezes tenho dado comigo a pensar: ó António, se calhar era melhor fazeres uma cura de repouso mental, não te preocupares tanto com o que se passa por aí, coisas que não compreendes, que te parecem inconcebíveis.
    Algo, no entanto, me impele a que não me devo aquietar, às vezes sinto-me como que com a obrigação de dizer do que está mal, talvez que possa dar um contributo para ajudar à procura de melhores caminhos para o nosso futuro coletivo.

    Sinto-me numa grande inquietação, é verdade.
    Muitas dúvidas.
    A fraquejar? Não, não podemos.
    Não devemos.

    Valha-me Deus...

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    1. Olá, António.

      Estou contente por ter trocado a sua amargura por palavras de discernimento.

      Ninguém nos pune por estarmos tristes, mas a vida adquire um peso que quase não conseguimos suportar. Eu já fui muito infeliz, mas sempre que me sentia sem ar para respirar (e não pense que é uma imagem literária, era mesmo um impedimento físico) tantas vezes sentada na cama sem conseguir dormir, com vontade de sair porta fora e perder-me na noite para respirar melhor, mas sem poder fazê-lo, com as filhas a dormir noutro quarto (uma com 4 anos e a outra com 1), pensava que não podia deixar que a situação me vencesse. “Como é que se sai disto?” “Ainda hás de rir – te desta situação” dizia-me e pegava nos trabalhos que tinha, nessa altura dava aulas no então chamado Ciclo Preparatório (180 alunos de seis turmas… ) e corrigia testes, planificava trabalhos diferentes para as 4 turmas de português, que decidi trabalhar em unidades didáticas diferentes e agarrei-me a uma frase que tinha lido em menina, numa qualquer revista “feliz é quem se julga”. Sem me parecer que valha a pena entrar em pormenores, considero que aprendi a viver comigo e com as minhas limitações. Agora ridicularizo-me, sou impiedosamente irónica comigo, rindo do que me acontece e tantas vezes magoada por tão suscetível, vou aligeirando a vida. Continuo com sonhos por cumprir, mas recuso-me a soçobrar.

      Viver é difícil? Pois é. Eu nunca saboreei a palavra fácil. Não sou das que grite “até que a voz me doa”, mas objetiva, contundente e renovada de esperança sou das que resisto para além do expectável.

      Não há de ser agora que um punhado de inaptos, que nem sabem com que heroicidade se vence o quotidiano e em que pelos vistos ninguém votou, me vai derrubar.

      VIVA A VIDA!

      "E hoje é já outro dia" F. Pessoa

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  5. Bato-lhe palmas, Isabel.
    De pé!...

    De facto, hoje é já outro dia!

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    1. Guarde as palmas para quando e se me chegar a ver no palco. Aí agradecerei. Na vida não represento, sou eu um terrível pedaço de mau feitio, com muitas falhas, muitas dúvidas, muita suscetibilidade, muitas dores, muitas feridas, saradas umas, outras nem tanto, mas com uma vontade inabalável de viver com os pés assentes no chão e um sorriso nos lábios, doa o que doer, caminhando em frente, buscando horizontes em verde, de peito aberto ao vento e à chuva, sem medo de equívocos, mas pronta a desfazê-los, se surgirem.

      A vida não se aplaude. Vive-se. E cada um tem obrigação de glorificar o dom extraordinário de ter nascido, vivendo a vida da melhor maneira possível.
      Esta forma é a minha. Sofrida, mas sem dramas. Outras haverá :)

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