Eu mergulhara em açúcar. Primeiro misturara-me com as cerejas, logo depois com as ginjas e surgiram os néctares.
Passada essa primeira fase apareceram os figos. Colhera-os a Carma da figueira do quintal da tia. E cá em casa há figos em calda e doce que resultou dos mais maduros.
A Carma também trouxe marmelos. Fiz marmelada.
E no meio de tanto doce chegou o poema, enviou-mo a Amélia Pais http://barcosflores.blogspot.com
Fazer compota em julho
Uma mulher a fazer compota em julho
revela-se resignada a viver com o marido.
Não vai fugir às escondidas com o amante.
Se assim não fosse, de que serviria cozer fruta com açúcar?
E vejam como ela o faz de boa vontade,
como um trabalho feito com amor,
mesmo que o espaço tenha um valor excessivo
e não haja sítio para armazenar os boiões.
Uma mulher a fazer compota em julho
está a preparar-se para ficar por aqui durante uns tempos.
Pretende aquartelar-se e hibernar
para atravessar os desconfortos do inverno.
Se assim não fosse, por que razão - e, notem,
sem que haja nisso qualquer dever -
gastaria ela o verão tão breve
a limpar restos de compota.
Uma mulher a fazer compota em julho
no meio do caos de uma cozinha cheia de vapor
não se está a preparar para fugir para o Ocidente
ou para comprar um bilhete para os EUA.
Essa mulher há-de escapar aos desmoronamentos da neve
salva pelo sabor da fruta.
Na Rússia quem faz compotas
sabe que não há saída.
Inna Kabish
DE Luís Parrado a partir da tradução inglesa de Fay Marshall e Alex Marshall reproduzida em An anthology of contemporary russian womem poets, selecção de Valentina Polukhina e Daniel Weissbort, University of Iowa Press, Iowa City, 2005, p. 69).
Cá para mim, quem, sem marido, faz compota em Setembro, vive no Ocidente, num país onde a neve não constitui um perigo e não pensa emigrar para os “States”, vai “obrigar” os amigos a comer tudo o que andou a confeccionar.
Sim, falta espaço para armazenar os boiões e o doce de abóbora ainda nem está feito…
Como não se ficar seduzido pelo indizível sentir da necessidade do viver em conformidade...:
ResponderEliminar- com o próprio estilo de viver da comunidade?
- com a cosmicidade do espaço em que se vive?
- com o quase irreal ar que se respira, que envolve as pessoas?
Foi este envolvimento que o poema que acabei de ler me transmitiu...neste momento, no meu lugar, na minha vida!
Ah! E as compotas, como me poderia esquecer das compotas? mmm
O António é um poeta do quotidiano!
ResponderEliminarBem-haja pelas suas palavras.
Se tudo o que é Doce nos faz Feliz fazer dieta deles é fazer dieta da Felicidade
ResponderEliminarOlá, euchavi.
ResponderEliminarFaz dieta da felicidade, não quem deixa de comer doces, mas quem não é capaz de mergulhar na alma humana com o coração enamorado e os olhos em verde.