Às vezes o telefone toca às oito
horas: “bom dia, com alegria” – desejam-me, com entusiasmo, mal levanto o
auscultador - “bom dia, também para ti” e rio-me contagiada pela força que
aquela voz me transmite.
Domingo de manhã, acordei mais
tarde. Vagueei pela casa, ou melhor “reginei”. “Reginar” é um verbo familiar,
inventado em “honra” de uma amiga das minhas filhas que passava o tempo em “fralda
de camisa”.
Após o pequeno-almoço lembrei-me que
há muito não sabia do meu amigo J. M. e liguei eu, plagiando a saudação.
Nem sei como, a não ser estabelecendo
aquela velha analogia das palavras com as cerejas, que mal nós puxamos uma vem
logo outra agarrada, acabei falando de um assunto recente que não estaria bem
resolvido. Eu! Que gosto de tudo bem maduro! Que só gosto de falar dos puzzles
depois de saber onde se encaixam as peças! Fiquei de vidro! Mesmo em ponto de
rachadura!
Saí porta fora e fui andar. Aliás
a ideia já era essa, mas até fui mais ligeira, porque quando não estou bem
sinto uma necessidade enorme de dar distância ao pensamento. É assim que desato
os nós. Se o meu amigo e colega de liceu P.C.S., que chegou a ser meu médico,
ainda fosse vivo, não deixaria de comentar ”que sorte a tua, há quem fique em
casa a curtir a telha!”
Cheia de pena de mim apetecia-me
chorar; nem sabia se conseguiria ir dar almoço à minha mãe, que lê em mim melhor
que num livro aberto (aí o tamanho das letras pode dificultar); mas achava que
numa manhã tão bonita em que soprava um vento outonal sibilando uns decibéis acima
do habitual, fazendo rodopiar as folhas muitas delas já vestidas de tons
avermelhados, isso seria um desperdício. “Há-de aparecer alguém com quem me
apeteça rir!”
Então, aparece um casal amigo com
quem me costumo cruzar, só que a minha amiga comprou há muito tempo o catálogo
das doenças…
Cumprimentámo-nos. “Nem te via”
diz-me ela “venho sempre a olhar para o chão” “Isso é para ver se encontras a
nota de quinhentos euros que acabei de perder” brinco ”não, as minhas cataratas
fazem-me ver as caras das pessoas assim” e mimoseou-me com um esgar “Ah! Mas isso
é divertidíssimo!”
Despedimo-nos e continuámos em
direcções opostas, mas a minha manhã estava salva. A partir daquele encontro
fui imaginando como a minha amiga veria as caras das pessoas com quem me
cruzei.
A quem interessar: fui dar o
almoço à minha mãe e tudo correu às mil maravilhas.
A quem interessa observa facilmente que a tua escrita é viciante:)=
ResponderEliminarGosto da tua maneira de viver. De frente:)
Olá, M.
ResponderEliminarQue bom ver-te por aqui! E que gentil! Bem haja!
Não passo de um bicho-do-mato M. :)
Se compararmos com os outros bichos que por aí andam...Não tens razão de queixas:)
ResponderEliminarObrigada, M., por me considerares um bicho raro:)
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