No final da minha adolescência, li cinco vezes o livro “Orgulho e Preconceito” de Jane Austen. Revia-me naquela Isabel profundamente responsável mas terrivelmente irónica que, apaixonada, acaba por casar com Mr. Darcy. E uma relação assim passou a fazer parte do meu imaginário. Amor misturado com a capacidade de nos rirmos uns dos outros, não para nos ferirmos, mas para mais facilmente se suportar as agruras do quotidiano.
Em casa éramos divertidos. O meu pai era exigente com as horas das refeições, sendo sempre o primeiro a sentar-se à cabeceira da mesa virada à porta da sala e o meu irmão, nomeadamente ao jantar, quando tudo parecia ir decorrer com normalidade, propunha ”mãezinha, dou-lhe dez escudos se der um beijo na ponta do nariz do paizinho”. Começava o teatro, o meu pai esquivava-se ao beijo e a minha mãe fazia tudo para ganhar os dez escudos e quando o meu pai já de cabelos arrepelados se deixava vencer e a minha mãe conseguia o intento e reclamava o prémio, o final era sempre o mesmo “a mãezinha não se lembra dos vinte escudos que me pediu emprestados a semana passada? Agora já só me fica a dever dez”. A minha mãe fingia que barafustava e o jantar seguia normalmente.
Por isso eu adorava aquela Isabel que Jane Austen tinha criado, achava que ela se enquadrava bem no meu ambiente familiar, achava que poderia ser assim quando fosse grande.
Em 1995, já nem sei em que canal da TV cabo, passaram os episódios da série “Orgulho e Preconceito”. Tal como se faz no autocarro, eu tocava a campainha, parava o mundo, apeava-me dos afazeres e deliciava-me com os encontro e desencontros entre Isabel e Mr. Darcy desempenhado magistralmente por Colin Firth e falado num inglês puríssimo.
Hoje fui ao cinema. “O Discurso do Rei” e voltei a encontrar-me com Colin Firth no extraordinário papel do reencontro de um homem com a sua própria voz.
Não deixem de ver, Colin Firth está no seu melhor.
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