No início de um Setembro, que aconteceu há muitos, muitos anos, escrevia assim:
Depois de uma tentativa falhada, numa prova inequívoca do que é capaz a persistência humana, ela ficou, caída em negro fundo e dividida, uma parte de si esmagada, outra ali, funcional e disposta a tudo para chamar a atenção.
Quem fora dado a pensamentos fáceis diria “desculpa esfarrapada para não a utilizarem”; pessoa normativa não deixaria de comentar “tontarias, agora aguente, fica sem ela”; alguém extremamente afectuoso diria ”coitadinho, essas coisas acontecem”; o indiferente limitar-se-ia a um “bah!”; enquanto o egoísta estenderia a mão num “vem a mim” e o ansioso não deixaria de perguntar “o que faz aqui?”
E eu? Bom, eu, quando vi a minha imaculada saia branca com a traseira transformada em tela picassiana, questionei-me “porque não terá o artista assinado a obra?”
Então vi-a, depois de quase ficar em minha casa ela ali estava, a tampa quase esmagada no fundo do carro, o resto no banco, enfiado entre o encosto e o assento.
Foi para não me escreveres que cá deixaste a caneta?
Hoje, rio-me ao concluir que, se o carteiro tivesse vindo tantas vezes quantas as que desejei, ter-me ia casado com ele e ainda andaríamos por aí os dois, de bicicleta, a distribuir cartas, mas só as que trouxessem boas notícias, as outras deita-las-ia fora.
É caso para perguntar se o carteiro já chegou, com as últimas notícias mais desejadas!
ResponderEliminarEscola Prática de Administração Militar. Mafra. 1968, Setembro, Outubro, Novembro...
O meu pelotão, soldados cadetes milicianos, formado, na parada traseira do Convento de Mafra. O nosso comandante era o Tenente Crespo, aqui de Leiria, nem por isso de grandes falas comigo, atenção à disciplina militar.
Começa a distribuição da correspondência. João Manuel, António Maria, por aí fora, não chegava o meu nome. Por fim lá chegou a minha vez. Carta da Zaida.
Destroçávamos, íamos ler as cartas. Um alvoroço. E quando vinham beijinhos, que bom que era.
Mais tarde, já em África. Aerogramas e mais aerogramas. Que ansiedade quando os recebíamos!
Tanta correspondência! Quanto tempo passado!...
Verdade seja dita:- Nem sempre o carteiro bate duas vezes.
ResponderEliminarEu que aos 18 anos saí de casa, vagueei por este mundo infindável, nem sempre tinha correspondência.
Lembro-me de já estar casado e, estar numa montagem duma rede Eléctrica em angola e, não receber notícias durante uma semana de minha mulher que, até por sinal estava grávida.
Que aflição. Isto corria o ano de 1968. Depois, en 1972 em Timor. Que saudades desses tempos...
Depois do carteiro de Pablo Neruda...Serias a minha preferida:)
ResponderEliminarOlá; António.
ResponderEliminarO carteiro, se veio, encontrou a caixa de correio tão atafulhada de publicidade, que deu meia volta e foi embora. A carta já não cabia.:)
Infelizmente perdemos o hábito de escrever cartas.
Fui mexer nos meus papéis velhos por sua "culpa". Ouvi aquela música linda no seu blog: "Love Letters" e veja o que aconteceu... para além de lhe "furtar" a música!
É claro que aquela carta não acaba assim continuava dizendo "E, independentemente da resposta, por conta de uns olhos que me encantam..." e ... lá iam uns beijinhos. Nós até nos contentávamos com pouco. :)
Julgo que saberá que o Crespo já faleceu há vários anos. Ele era pouco falador. Não era defeito, era feitio.
Olá, João das flores!
ResponderEliminarEsta ideia peregrina de ir mexer em papéis velhos ajudou-nos a dar um mergulho na juventude. Às vezes sabe bem olhar para trás e sorrir para as coisas bem resolvidas.
Nem calcula o que me tenho divertido. Felizmente guardei só algumas cartas, porque eu escrevi quilómetros de papel. Troquei correspondência com imensos amigos e amigas; se tenho guardado tudo teria que ler até ao fim dos meus dias... :)
Querida M.
ResponderEliminarOs teus comentários são sempre uma simpatia. Só me falta a bicicleta. :)
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