Tive em tempos um relógio cor de laranja, números e ponteiros brancos.
Joquinha, assim o chamava, nasceu relógio despertador e por isso mesmo possuía um martelinho dourado no alto que lhe martelava as orelhas gorduchas, nas manhãs frias em que me fazia saltar da cama.
Joquinha, além de lindo, revelou-se desde o primeiro momento um relógio simpático e compreensivo. Dirão que relógio que se preze não possui tais qualidades, mas relógio que se preze nunca se chamaria Joquinha, seria simplesmente relógio.
Estabeleceu-se entre nós uma tal cumplicidade que o seu tempo passou a ser o meu tempo. Esqueceu o sistema sexagesimal e funcionava ao ritmo do meu peito. Se o meu coração estava inquieto, ele trabalhava depressa, mas não havia como ele para se alongar, parando até na tentativa louca de me prolongar os momentos importantes.
Joquinha calou-se de vez no dia em que morreu Chiquinho Pirilau. Desde então, nunca mais ouvi, ao entrar a porta de minha casa, o tic tac descompassado do Joquinha, nem o canto radiosamente amarelo do meu canário.
Depois, alguém o desfez ao tentar quebrar-lhe o silêncio.
Se Joquinha existisse, hoje não era quinta-feira. O tempo teria parado e eu alongar-me-ia numa outra dimensão para revisitar aqueles de que me lembro e de que não tenho notícias, aqueles que passaram pela minha vida e que não voltei a ver, aqueles que possivelmente não voltarei a encontrar.
Que será feito do Manel, da Bia , da Berta, do Sérgio, da Mélita, da Otília e de tantos outros de que perdi o contacto?
Eu lembro-me deles
Lembrar-se-ão de mim?
sexta-feira, 25 de março de 2011
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário