Páginas

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

TARDE DE TERÇA-FEIRA, TREZE


Depois de almoço, quando saía de casa, não pretendia passear pela margem do rio, mas levava comigo uma vontade irresistível de me deliciar com a paisagem.

Havia pegado na máquina fotográfica, descido as escadas e enfiado no carro, na firme disposição de ir a pé, pelo Marachão, o caminho mais longo até ao Centro Cívico, para cumprir as minhas horas de voluntariado.

Parei o carro junto às piscinas, como habitualmente, só que em vez de caminhar em direção à  Ponte Europa, virei para a cidade.

Fiz o primeiro registo.


Há muito tempo que não nos cruzávamos. Aconteceu: "Posso oferecer-lhe uma coisa para ler?" "Claro que pode" - respondeu o meu melhor sorriso, à vista da pagela. " A senhora é tão simpática! Posso oferecer-lhe também esta revista?" pergunta a amiga. "Com certeza!".

E segui carregada com aquela literatura que remetia para a Bíblia (aviso das senhoras- apóstolas de Jeová), dobradinha no bolso da parka que transportava no braço, à espera de um caixote de lixo distante, que não lhes entristecesse as feições.

O sorriso, às vezes, prega-nos partidas.




"Será que vou encontrar o monge budista, na camisa de xadrez azul com a gravata amarela? Será que hoje veste a camisa de xadrez verde com a gravata castanha? Por que chão estenderá agora os livros que não vende?" Saberia depois, que não. Ainda não foi desta.


Passei com habitualmente por baixo da ponte que liga Leiria e Marrazes olhando para o alto, como sempre faço.

E a voz da minha mãe, que tanto se preocupa com as minhas passeatas pelo rio - "vê lá se escorregas e cais à água... " E eu a rir: "Ora, sei nadar!"



Deixei que o casal se afastasse, para fazer o registo, porque me apeteceu caminhar para algum lado que não existe, também assim, com alguém ao meu lado. Quem visse haveria de dizer: "Levava asas leves e brincos na alma" (Alice Brito, As mulheres da Fonte Nova, pág 111)


"No chão, tapetes de folhas secas acusavam a madureza do tempo à espera do Inverno." (Alice Brito, As mulheres da Fonte Nova, pág 175)


E eu sub-repticiamente a caminhar, mal levantando os pés, feita pássaro no movimento que imprimia às folhas.



Olhei para trás... A beleza afirmava-se 



E afirmar-se-ia mais ainda, olhando em frente, à vista do Parque...


E fui andando... materializando o infinito no ponto, ao fundo, com que a perspetiva me enganava. E eu deixava que me enganasse. Estava ali para isso.


 A ponte chinesa, a minha preferida. "Justapõe-se" dirão alguns... e daí? Que leveza!


Olhei para o lado. Gosto de olhar em todas as direções. Os referentes ajudam a fixar a rota.


E a vida, força a acontecer em qualquer lado, inegavelmente, com um pingo de água e uma réstia de sol. Somos iguais: basta-nos pouco para desabrocharmos...



Praça Eça de Queiroz... As horas cumpriram-se...


 Um olhar à esquerda, naquele fim de tarde. 

E à direita...

E aquela sensação de liberdade mesclada de ausência a percorrer-me o corpo, trouxe-me de volta.



8 comentários:

  1. A minha cidade é assim... tão bonita
    Ou será da forma como a pinta?
    :)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. É mesmo a cidade. Basta ver. Enche os olhos e conforta a alma.

      Eliminar
  2. Que saudades tenho de fazer esse percurso sozinha,gozando a paz,o silêncio,o sol morno,a brisa suave,"refundando" a alma...

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Amiga,
      Ando com uma manifesta alergia, que se manifesta numa urticária mental gravíssima, sem lenitivo que acalme a coceira, a todas as formas de verbo refundar. :)
      Onde estás tu, que não vens andar para a margem do rio? No neto? Se é isso conforma-te. Não podemos ter tudo bom. Qualquer dia, voltarás a alonga-te com o Lis.
      Gosto de te ter por aqui.
      Beijinho

      Eliminar
    2. Pois esse é o caminho das minhas passeatas quase diárias,( a Rosário sabe..) já que o marachão é o "meu jardim" ao abrir a porta de casa ... Já fiz muitas fotos porque a beleza a isso nos obriga. Também costumo encontrar o "monge budista da gravata amarela" ( pensando agora melhor, há já muito que o não vejo...). Tenho pensado muito enquanto passeio por essas margens e olho as "quatro estações" e guardo tudo o que vejo, oiço e sinto e, às vezes, sai texto...http://estrela-da-madrugada.blogspot.pt/2008/05/rio-sou.html - outras vezes andam as sensações a passarinhar cá por dentro. Mas, verdade, verdade é que um passeio por estas margens, faz milagres. Volta, Rosário, para lavares os olhos nestas cores e brisas. Beijos para as duas.

      P.S. - a ponte Europa é aquela a jusante das piscinas a que chamo, a brincar, " vasco da gama " ? Porquê Europa ???

      Eliminar
    3. Olá, Fernanda.
      Já espreitei o seu blogue e deliciei-me com o texto. Que sorte a do Vasco!
      Pois eu também não sei que será feito do "nosso" monge budista. As apóstolas de Jeová também estiveram uns tempos sem aparecer. Eu já nem sabia que ler, devido à faltas das pagelas que costumam oferecer-me :)
      Também passeio quase diariamente pela margem do rio, mas ainda não nos encontrámos. Normalmente vou de manhã. Hoje era para ir de tarde, mas desabou um chuva grossa, tocada a vento, quando estava para sair de casa. Já não fui.
      A ponte Europa é sem dúvida a sua "Vasco da Gama". Porque se chamará assim não faço ideia, talvez falta de imaginação da anterior presidente cá do burgo.

      Eliminar
    4. Esqueci-me do beijinho. Aqui vai. Beijinho!

      Eliminar
  3. Olá Fernanda.

    Há sempre um anjo caridoso que vela por mim! A propósito da sua questão sobre o nome da ponte, recebi, por email, a explicação de um amigo, que transcrevo:

    "Aquela ponte foi baptizada de Ponte Europa pq foi construída para dar acesso ao novo estádio pelo lado poente da cidade, aquando do Euro 2004.
    Como eu sei tanta coisa..., dirias tu!"

    Então e não é que sabe mesmo?!

    Fica o esclarecimento.
    Beijinhos para os dois.

    ResponderEliminar