Pelo último dos mesmos critérios
teremos a vida por imperfeita por a julgarmos consubstanciada com a
imperfeição, isto é, não existente, porque a não existência, sendo a negação
suprema, é a absoluta imperfeição. Teremos a vida por ilusória; não já
imperfeita, como para os gregos, por não ser perfeita; não já imperfeita, como
para os cristãos, por ser vil e material; senão imperfeita por não existir, por
ser mera aparência, absolutamente aparência, vil portanto, se vil, não tanto
com a vileza do que é vil, quanto com a vileza do que é falso. É deste conceito
de imperfeição que nasce aquela forma de ideal que nos é mais familiarmente
conhecida no budismo, embora as suas manifestações houvessem surgido na Índia
muito antes daquele sistema místico, filhos ambos, ele como elas, do mesmo
substrato metafísico. É certo que este ideal aparece, com formas e aplicações
diversas, nos espiritualistas simbólicos, ou ocultistas, de quase todas as
confissões. Como, porém, foi na Índia que as manifestações formais dele
distintivamente apareceram, podemos ser imprecisos, porém não seremos
inexactos, se dermos a este ideal, por conveniência, o nome de ideal
índio.
Fernando Pessoa, in Textos de Crítica e de Intervenção
Fernando Pessoa, in Textos de Crítica e de Intervenção
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