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quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

LE TEMP VA

Este fim de tarde vestiu-se de chuva miudinha, mas eu precisava de comprar uma prenda para uma amiga aniversariante e adquirida esta, independentemente do estado do tempo, não me apeteceu voltar de imediato para casa. E lá andei passeando à chuva sem me preocupar com as horas. Vantagens de quem vive sozinha! Há horários e obrigações que foram completamente banidos do vocabulário e do quotidiano, no meio da maior das anarquias.

Não foi por isso que, num dos contra-sensos em que sou tão pródiga, deixei de comprar o relógio que há algum tempo “namorava” para a parede do meu escritório. “The right Time” afirma a rodela de vidro negro em letras prateadas, como se isso me preocupasse, mais um para “bater” a qualquer hora. Right foi o preço, que em saldo teve um desconto de cinquenta por cento! Mas a compra foi efectuada já com a maior parte das lojas encerradas, a caminho do parque de estacionamento onde me esperava o automóvel.

Antes vagueei pela cidade pensando no Carlos do Carmo que, no momento em que estacionei, me sussurrava ao ouvido “quand le temp va tous en va”. “Mentira!” Contrapus de imediato. “olha para mim e diz, vá, diz o que fizeram ao meu tempo. Ainda ontem jogava ao berlinde com o Aniceto, na Rua D. Carlos I e à pedrada com o Carlitos na esquina onde ficava a loja da D. Alda e agora? Achas que se pedir uma moeda à minha mãe e for ao “Região de Leiria” fazer um furo, na esperança de que me saia um chocolate venho de lá com um pente de plástico amarelo? E as três barrocas para jogar ao berlinde, faço-as no alcatrão com o calcanhar de que sapato? E a Maria? Achas que ainda vai à Fonte Quente lavar o bordado inglês dos folhos das minhas combinações? Ou será que pensas que os vestidinhos franzidos cheios de florinhas ainda me servem? E o Carlitos? Em que nuvem estará para podermos brincar?

O meu tempo, independentemente de cada relógio de minha casa marcar a sua hora, caminha inexoravelmente para o fim, mas fresquinho, novinho em folha, imaculado, ainda por estrear eu tenho guardado um sonho, que acordada, passo muitas vezes no ecrã do pensamento, mas com os olhos fechados para que as pálpebras protejam as imagens da poeira dos anos.

Sou uma mulher de esperança, o meu sonho é intemporal.

O Carlos do Carmo tem uma voz que me encanta o Bernardo Sasseti é muito bom, mas este CD não é para mim.

3 comentários:

  1. Bem-haja, por partilhar essas preciosas gotas de chuva, pérolas autênticas, as suas palavras.

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  2. Muito obrigada Rui. Pérolas são as suas palavras e inesgotável a sua simpatia.
    Bem-haja!

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  3. Claro! O nosso tempo caminha inexoravelmente para o fim... mas vamos acompanhá-lo sempre com a mesma força, com o mesmo entusiasmo!
    E... morrer de pé, como as árvores!

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