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domingo, 9 de janeiro de 2011

O PAI NATAL

“Nunca mais vem o Pai Natal” suspirou o André recostando-se na cadeira que ocupava à mesa, durante o jantar de Natal. “Acho que só vem quando acabarmos de comer” explicou a mãe para acalmar a impaciência e todos sorrimos comentando uns com os outros que os “crescidos” são muito lentos a mastigar.

E o André continuou a tecer o tempo com o piscar das luzes da árvore de Natal intercalado de breves paragens “avó, as luzes pararam outra vez”, “as luzes são mágicas, se disseres perlim pim pim voltam a piscar”.

Os “crescidos” mastigaram o que havia para mastigar e chegou a hora do Pai Natal entrar em cena; mas este, no momento exacto teve uma birra e disse que não faria o papel. Pudera, da última vez a representação tinha sido um fiasco!

No Natal de 2008, tinha o André três anos acabadinhos de fazer, pois celebra o aniversário em finais de Novembro, a avó (convém lembrar que em relação aos netos são sempre os avós que alegremente se disponibilizam a encarnar os papeis de “o cavaleiro da triste figura”), vestiu-se de Pai Natal: fato vermelho, umas almofadas a aumentar a barriga, cinto preto a segurar, umas barbichas bancas, barrete enfiado até aos olhos e batendo na persiana da varanda da sala entrou com a estridência que se atribui ao velhinho de ar bonacheirão que já todos adoptámos. O André, com três anos, permito-me frisar, olhou o Pai Natal e antes de se interessar pelos presentes, como seria previsto, comentou “é a avó Buita”.

A avó Buita, que com a destreza da fala já ganhou o estatuto de avó Belita, é uma senhora que eu conheço, mas que obviamente nem vou dizer quem é, porque não me acuso, até faz teatro, ou como ela costuma dizer “arma barraca” o que significa que costuma “vestir” com mais ou menos à-vontade diferentes personagens, não se atrapalhando nada em “assassinar” Molière ou Gil Vicente, dramaturgos que adora torturar mas, nesse instante… a avó Buita sentiu-se perante um público exigentíssimo, no papel mais ridículo que alguma vez desempenhara. “Foram os olhos”, sentenciou a tia, “o olhar traiu-te”.

Então este ano o Pai Natal estava apressadíssimo, mais velhote, coitado, cada vez com mais prendas para entregar. Soaram os guizos das renas, ouviu-se bater na persiana, terá descarregado as prendas e quando acabámos de abrir dispostos a convidá-lo para entrar, perscrutámos a noite, queríamos contar as renas, mas já nem o trenó divisámos no céu, do Pai Natal nem rasto. Do mal, o menos! Havia prendas para todos.

Abertos os presentes, o André quis saber se o Pai Natal já teria chegado a casa da avó Lai, que mora longe, em Portimão. “O melhor é telefonar” e o pai ligou. Estavam todos bem e o Pai Natal estava mesmo, mesmo a chegar, naquele preciso instante. Que sorte! O André aproveitou a ocasião e falou com ele “gostei muito das prendas, mas pedi-te o porco comilão e não me deste” o telemóvel estava em alta voz e ouvimos a resposta ”talvez esteja aqui, vou deixar à avó Lai umas prendas para ti”, “eu estou em casa da avó Belita”, “ eu sei, mas quando aí passei esqueci-me de deixar todos os embrulhos”, “não faz mal eu brinco com estes brinquedos. Adeus, Pai Natal, obrigado”; “adeus, porta-te bem”.

Que bom ter cinco anos!

Até eu acreditei que era o Pai Natal que falava e não o tio Filipe a disfarçar a voz.

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